Quanto à origem do ator romano, o historiador Tito Lívio (
O romano da antiguidade teve menor inclinação para a arte dramática, optando pelos jogos violentos, pelas competições, pelas corridas e pelo circo. Talvez as guerras constantes travadas para extensão do vasto império tenham lhe dado certo desprezo pelos valores da cultura literária. Entretanto coube-lhe o especial papel de transmissor de culturas, à medida que ia dominando e assimilando a arte de outros povos. Sem a dimensão cerimoniosa do teatro grego, o teatro romano decaiu levando desses inícios a marca vigorosa do gosto pelo majestoso e pelo espetacular.
Antes do século II a.C., atores populares da cidade osca de Atela, na região da Campânia, de colonização grega, chegaram em grandes levas a Roma, pela via Ápia, portando divertidas máscaras e improvisando diálogos espontâneos e habilidosos, que caracterizavam tipos com padrões de comportamento conhecidos: Pappus, era um bonachão senil, vitima da mordacidade e da pilheria; Baccus, um camponês grosseiro, sempre infeliz nas aventuras amorosas, alem de idiota e guloso; Maccus, gordalhão vermelho e inchado, fanfarrão e imbecil, que se locupletava com suas torpezas; Dossenus, corcunda e astucioso, metido a filosofo0, pretendo tudo saber, exprimindo-se por sentenças sem sentido, que contrastavam com o analfabetismo dos campônios. Graças a estas máscaras, entre outras, os atores podiam se ocultar. Eram, de início, amadores sem nenhum intuito profissional. Improvisavam situações corriqueiras na comunidade a partir de um roteiro simples, o que não exigia nenhum esforço da memória ou recitação. Posteriormente a Atelana contou com artistas profissionais e foi incluidaem festividades estatais, sendo apresentada ao final delas, depois de representação das tragédias e do teatro sério, como o drama satírico na Grécia. Segundo observação do poeta satírico Juvenal (60 – 140 d.C), tanto uma como outra visavam secar as lágrimas dos espectadores.
Durante o império as Atelanas sofreram a concorrência dos Mimos e se interiorizaram pelas províncias de Roma. A diferença entre os atores da comédia Atelana e os mimos romanos é que estes não usavam máscaras mas tão somente o próprio corpo e a capacidade de mímesis, de mutação, quase nunca empregando a linguagem labial, já que o caráter essencial da representação ficava com a ação mímica da expressão fisionômica, do gesto e da dança. A origem desse gênero de espetáculo, assim, estaria nas danças primitivas em honra aos deuses, as quais imitavam animais, os atos e as paixões dos homens, os deuses da vegetação e da fecundidade, daí seu caráter às vezes obsceno. Numa fase mais avançada, estas danças passaram a contar com coros e seus couretas.
Também aqui duas linhas distintas de manifestação se desdobraram, promovendo caracteres que reduzirão cada vez mais o sentido mímico, dando origem à tragédia e à comédia romana. O mimo vai surgir quando o coro se desfizer e os dançarinos ganharem maior independência, como grupo ou isoladamente.
Conforme o testemunho dos poetas Ovídio (
Um primeiro ator conhecido como mimos romano teria sido Pompílio, referido por volta de
Vimos que no teatro grego o número de atores nunca foi além de três e os papéis femininos eram representados por interpretes masculinos. No teatro romano, são inúmeros os textos que exigem cinco atores, muito embora um único ator interpretasse várias personagens. As primeiras peças foram representadas por atores gregos e/ou romanos, chamados Comoedis, geralmente histriões recrutados nas camadas inferiores da sociedade. Ainda assim, pela quantidade de teatros construídos , o número de atores foi crescendo a ponto de se criarem escolas de atores dirigidas por retóricos, e até o tempo de Cícero (106-
Os atores constituíam companhias sob a coordenação de um primeiro ator, todos propriedades de um amo ou senhor, que cobravam os soldos que eles ganhavam. As mulheres assumiram já desde o Império os papéis femininos, talvez por influência dos mimos, que sempre foram representados por elencos mistos. A remuneração que os atores recebiam variava segundo o critério dos organizadores e dependia sempre de seus méritos. Uma gratificação extraordinária poderia ser oferecida, caso o trabalho fosse realmente exuberante, além de prêmios, desputados
Outro fator que contribuiu para rebaixar a condição de ator foi o fato de as agremiações de atores gregos, à época da dominação romana, terem admitido em seu meio outras classes de artistas. Assim também os romanos nivelariam atores, gladiadores, atletas, acrobatas e bufões de baixa categoria; também os mimos eram aceitos em suas associações.
Apesar de tudo isso, os atores romanos conquistaram pouco a pouco uma condição social mais considerada, que lhes brindou muitas vezes com a convivência governamental, tanto da República quanto do Império. Havia entre os atores alguns favoritos, em torno dos quais o povo chegava a formar verdadeiras torcidas entusiasmadas: Ceteris por exemplo, usufruiu, além da popularidade, luxuosos privilégios públicos por ter sido amante de Marco Antônio (83-
Mas o teatro em Roma foi, tornando-se espetáculo deprimente, atingindo um nível de degradação tal que a sociedade sentia náuseas ante as execráveis encenações. Paris, o velho, e Paris, o jovem, pai e filho, foram vítimas, em seus tempos, do favoritismo e do assassínio promovido pelos imperadores Nero ( 54-68 d.C.) e Domiciano ( 81-96 d. C.); Mnester, outroescandaloso favorito de Messalina(22-48 d.C.), viu certa vez seus espectadores serem açoitados por ordem do imperador Calígula (
O grande educador Quintiliano (30-100 d.C.), na época do imperador Domiciano, tentou a reabilitação já se instituíra, e a Igreja cristã, indignada com a corrupção da cena, vai, através do teólogo romano Tertuliano (155-220 d.C.), “negar aos mimos e pantomimos qualquer pretensão à redenção cristã em sua obra De SPECTACULIS”, a não ser que abandonassem a profissão, segundo rezava o sínodo provincial de Illiberis, Granada, de 305 d.C. por essa época, os mimos buscaram o aplauso parodiando os adeptos e os cerimoniais da nova fé. Ainda assim, no século IV, o católico Arius propôs um teatro cristão para combater o paganismo da cena romana, o que lhe valeu a excomunhão como castigo. No entanto alguns mimos confessaram a nova religião: em 275 d.C., Porfírio se converteu, em Casaréia, na Capadócia; Gelasino, em 279 d.C., na cidade de Heliópolis, na Fenícia; um ano depois, Ardálio, no Oriente. O martírio do ator Genésio, em 303 d.C., em Roma, durante as cruéis perseguições aos cristãos promovidas pelo imperador Diocleciano (245-313 d.C.), promoveu a conversão do mimo a São Genésio, o santo protetor dos atores.
O edifício teatral romano tinha a orquestra menos espaços que a do teatro grego; por outro lado, a cena avançava bem mais. Suas construções eram imensas e com capacidade para acolher grandes multidões. Nesses ambientes, a voz era condição precípua para os atores, tanto na tragédia quanto na comédia. No ano
O trabalho de aprendizagem dos papéis, exigindo esforços pacientes e continuados, afugentou os jovens romanos mais afeitos à improvisação do que à interpretação de textos completos, que deveriam ser declamados de cor e segundo regras consagradas. Além disso, não lhes agradava a condição de escravo que o trabalho disciplinado do teatro exigia, com a posição de homens livres. Daí a preferência pela atelana, que se aproximava bastante dos divertimentos chamados SATURAS, tradicionalmente latinos, nascidos espontaneamente das festas regionais e que comportavam fantasias e máscaras alegres, permitindo aos intérpretes se ocultarem sob os disfarces. Como a SATURA, a atelana era improvisada a partir de um roteiro, não exigindo qualquer esforço de memória, nem de recitação.
O ator, nos últimos tempos romanos das invasões bárbaras, quando os teatros são fechados, vai manter-se ambulante com pantomimas e acrobacias. Assim, alcançaram aos poucos a degenerescência ea a espetacularidade mais baixa. Eram recrutados ente pessoas desclassificadas, mercenárias, apelando aos mais grosseiros efeitos para atrair o aplauso de uma sociedade também decadente, de instintos soltos e sensualidade desorientada. Os atores haviam perdido a dignidade e o senso moral, deixando longe no tempo o épico primitivo das atelanas, o primor e o brilho das comédias de Plauto (254-
trecho do livro HISTÓRIA E FORMAÇÃO DO ATOR - Enio Carvalho
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